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sexta-feira, 28 de maio de 2010

O Filme The Village (A Vila) visto sob os olhares Psicanlítico e Junguiano.







The  Village  ( A  Vila )  2004 - EUA

Direção: M. Night Shyamalan – Elenco: Bryce Dallas Howard, Joaquin Phoenix, Adrien Brody, William Hurt, Sigourney Weaver – Duração: 120 minutos –Gênero: Ficção/Suspense

No ano de 1897 uma vila isolada do restante do mundo é um lugar tranqüilo para se viver em comunidade e harmonia. Entretanto, para se viver tranquilamente, os moradores não entram na floresta onde vivem as criaturas chamadas “Aqueles de Quem não falamos”. O terror que as criaturas despertam na comunidade é o suficiente para manter os moradores afastados. Mas a pergunta é: até quando? O jovem Lucius Hunt (Joaquin Phoenix) solicita aos responsáveis pela vila que ele possa ultrapassar os limites da floresta em busca de remédios para as pessoas, pois um de seus amigos morreu e ele se sente um pouco impotente em não fazer nada. Porém, ele é informado pelo líder Edward Walker (William Hurt) e por sua mãe Alice (Sigourney Weaver) que ele não deve se aventurar. Entretanto, ele não desiste fácil de sua idéia. Apaixonado por Ivy Walker (Bryce Dallas Howard), Lucius também é amigo de Noah Percy (Adrien Brody), um jovem com problemas mentais que também ama Ivy , o que colocará em risco a vida de Lucius e Ivy. Desta forma, Ivy terá que fazer um grande sacrifício, no qual as verdades serão trazidas à tona.


Psicanálise explica ¹

O filme trata da história de nove pessoas que resolveram se afugentar do mundo urbano devido à violência dor, sofrimento e toda a falta de esperança que os grandes centros nos trazem. Juntos eles fundam um vilarejo no qual criam suas famílias isoladas de qualquer contato com o mundo externo.
Para manter o isolamento, esse grupo, chamado pelos habitantes da vila de “Os Anciões”, cria uma lenda sobre monstros que habitam a floresta que cerca o vilarejo. Todos os que entrarem na floresta serão mortos pelos seres chamados “Aqueles de quem não mencionamos”

Porém algo acontece no vilarejo que ameaça a manutenção da vila. Um jovem chamado Lucius Hunt, um corajoso rapaz que desejava passar pela floresta e ir as cidades em busca de remédios para seu povo, é atacado por outro rapaz com problemas mentais chamado Noah Percy, motivado por ciúmes de seu casamento com Ivy Walker.

A grande questão agora para o pai de Ivy, o Líder dos Anciões, estava entre salvar a vida de Lucius, permitindo que sua filha, deficiente visual, fosse até a cidade buscar remédios, ou manter a mentira sobre a vila, sacrificando assim a vida de Lucius.Mas o Sr. Walker não resiste ao amor da filha por Lucius e permite que a mesma vá à cidade e busque remédios. Antes ele conta toda a farsa sobre a história dos monstros, mas não adianta, por que Ivy ainda continua acreditando na existência de monstros. Durante sua caminhada, Noah encontra uma das roupas de monstro, e vestido nela, ele ataca Ivy na floresta, mas ela consegue matá-lo, achando assim que matou um dos temíveis monstros.

Ivy retorna da fronteira da floresta após encontrar um guarda que lhe fornece os remédios. Na verdade, os guardas da floresta são empregados das empresas Walker, e a floresta toda é propriedade do pai de Ivy, mas ela não sabe porque não pode ver. Ela retorna ao vilarejo e assim a vida na vila continuará a mesma.

O filme retrata o medo pelo desconhecido e o estabelecimento de defesas internas que as pessoas criam para perpetuar um sentimento de “segurança”. Podemos perceber que o enredo do filme mostra como os personagens se isolam em um mundo de “fantasia”, descrito por Freud em seu artigo “Para Além do Princípio de Prazer” como um mecanismo que leva o sujeito a negar a realidade que seria na verdade uma evitação do desprazer que o levaria a viver de acordo com o “Princípio da Realidade”.


Percebemos que há uma tentativa de “fuga” do mundo real, com o objetivo de manter a ordem no mundo interior, o que leva a instalação do “recalque”, onde barreiras são formadas como forma de se estabelecer a ordem nesse mundo do inconsciente. Essas barreiras são simbolizadas pelas florestas em redor da vila, pela instalação do medo do desconhecido, das criaturas descritas como “Aqueles de quem não mencionamos”.

Estão presentes no filme sintomas de experiências traumáticas que levam as pessoas a estabelecerem uma relação de “desconfiança perante a vida”, levando-as a quererem se esconder de tudo que causa desprazer.

Porém o inconsciente busca maneiras de romper essas barreiras. Ele nos incomoda, transgride as regras e encontra formas de nos empurrar “para fora da vila”. Esse inconsciente é tipificado no filme pelo personagem Noah, um homem com a mentalidade de uma criança de cinco anos que não aceita regras e é extremamente desobediente, pois com freqüência ele adentrava a floresta sem medo das criaturas.

Um evento inesperado gera uma crise na vila, quando o personagem Lucius é ferido por Noah e precisa de “remédios”. Uma decisão precisa ser tomada: ou deixamos Lucius morrer ou nos arriscamos e saímos da vila, enfrentando os medos. Será que o personagem Lucius não representa uma vontade de ir mais além, de quebrar as regras, os recalques que nos impedem? Somente quando esse “Lucius” que está dentro de nós manifesta sintomas de morte é que corremos em busca de remédios.

As crises instaladas em nosso interior provocadas pela depressão, ansiedade, transtornos obsessivos, pânico colocam em risco o “Princípio de Vida” e nos colocam diante de uma escolha: ou morremos ou nos aventuramos “cegamente” no interior da floresta. Não seria a personagem Ivy um retrato do desejo de se ver livre do medo? Para vencê-lo é preciso encará-lo. Mas como encarar aquilo que está no nível do inconsciente?

Mesmo sabendo que ela não poderia ver os “monstros” da floresta. Mesmo sabendo que eles não eram reais, pois seu pai havia contado a ela a respeito da farsa, ela ainda assim sentia a presença desses monstros. Não seriam esses monstros uma figura das percepções equivocadas que nosso aparelho psíquico faz a cerca dos eventos? Entendemos que não são reais, porém não conseguimos evitar as emoções negativas que eles provocam.

Concluindo, é preciso ter coragem para entrar na floresta, assim como é preciso ter coragem para entrar em processo de análise. Quando iniciamos um processo de análise entramos cegos. Não enchergamos o que há na floresta. Aos poucos as resistências vão caindo até conseguirmos a atravessá-la por completo, o que muda nossa percepção acerca da vida. O medo nunca desaparece por completo, porém entendemos que ele não é real e que é possível vencê-lo todas as vezes que ele se manifesta em nossas vidas.


Sob o olhar Junguiano ²

Este filme reflete a tendência comum do ser humano em tentar encobrir o mal, negando, escondendo, fugindo e ocultando-o como um segredo.No filme, a vila é uma tentativa de criação de um local, um mundo ou uma realidade sem maldade, sem distorções, onde somente o bem e a inocência tenham lugar, como um oásis no meio de um deserto, um lugar puro em meio à feiúra do mundo e da realidade humana.

Segundo Jung, tudo que negamos em nós, coisas boas e ruins, viram nossas sombras. Afirma também que é da natureza humana termos múltiplos aspectos polarizados e contrários. Tendemos em nosso dualismo negar o mal em vez de transformá-lo e integrá-lo. Desta forma, escondemos este nosso aspecto como um segredo que deve ser escondido a sete chaves, já que o tememos e sentimos dele vergonha.

Temos vergonha exatamente do que nos faz humanos. Ter o mal dentro de si não significa que tenhamos que atuá-lo ou usá-lo de forma destrutiva. Ao aceitar que isto é uma característica humana, podemos trazer às claras este aspecto, diminuir sua força e ter alguma escolha sobre ele. Aceitar sua existência sem negá-lo ou escondê-lo traz para nós força e coragem, escondê-lo gera medo e fraqueza.

Há linhas de psicoterapia que trabalham com estes aspectos sombrios quando necessitamos de ajuda externa. Mas procurar estar na verdade e termos a coragem de olhar e reconhecer nossas distorções sem culpa é algo que todos podemos fazer e é uma ação realista que nos fortalece.

Quantas pessoas, famílias, grupos, comunidades e sociedade são enfraquecidas pelos seus segredos. Os segredos geram pensamentos, mentiras, contaminam a confiança entre pessoas e a própria autoconfiança. Há um grande alívio quando nos liberamos do cárcere de nossos segredos e isto nos torna mais honrados .

A nossa honra está em sermos íntegros e verdadeiros, mesmo que falhos e humanos. Nossa honra não está na aparência e em nosso anseio de perfeição. No filme, um dos “anciãos” conclui: “perdi lá fora um familiar e aqui já perdi vários. Aprendi que o sofrimento faz parte da vida.”

Na “vila”, criaram uma realidade a parte, sustentada pelo terror e mentira com o intuito de encobrir a realidade comum e se afastar de uma sociedade violenta. Criaram uma comunidade “pura” e “inocente”, onde seus habitantes são humanos e imperfeitos, onde mais cedo ou mais tarde, o crime brota como uma realidade não transformada no coração e atos dos homens.

É mais fácil escravizarmo-nos do terror de um monstro externo que se perpetua na ignorância que enfrentar o “monstro” interno que poderia ser transformado. Ninguém precisa aceitar ou gostar da violência social e nem se adaptar a ela como algo desejável ou comum. Mas queiramos ou não a violência social é um reflexo de seus membros. A violência externa é o resultado da violência interna não transformada. Mas como transformar a violência interna sem aceitar sua existência como uma realidade humana? Como transformar a violência externa sem aceitá-la como fruto da “doença” individual de todos os seus membros e não de somente uma parte que tem que ser excluída, banida e castigada? Podemos até procurar proteção criando condomínios fechados, altos muros e fortalezas para nos afastarmos do fruto que nós mesmos ajudamos a criar. Mas levamos o inimigo dentro de nós para dentro da fortaleza, já que é parte de nossa natureza humana.

Como fortalecer o amor e a inocência em meio à mentira? Como preservar a inocência e proteção de nossos filhos sem ensiná-los a lidar com suas próprias destrutividades internas? Quanto tempo podemos afastá-los ou apartá-los do perigo, isolando-os da realidade humana à qual pertencem?

Por fim, o filme mostra uma saída no amor, que move montanhas, na cegueira que enxerga com os olhos da sabedoria dos sentimentos, e da coragem que se fortalece não no aparente bom senso, mas no ato humano de fazer o que tem que ser feito para preservar a vida digna sem medos.


Trailer


















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